quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

o vagabundo

por muito pouco que nao deixo passar batido: ontem completaram-se 30 anos da morte de charles chaplin.
bom, eu nunca me prestei pra pseudo-jornalista, mas esse tiozinho vale a pena ser comentado. entao tentemos.



pularei a parte biografica. dela a internet esta cheia. a propria wikipedia tem um resumo bastante bom, apesar de alguns detalhes errados e de eu nao gostar dela. vou direto pra minha especialidade, que eh a opiniao pessoal =)
e de acordo com ela - a opiniao pessoal, nao a wikipedia - este eh um dos caras que a gente pode chamar de O cara. nao porque foi um super ser humano - tanto a versao crianca-sofrida-complexada-coitadinha quanto a calculista-egocentrico-hipocrita-comunista-E-comedor-de-criancinha que habitam as biografias me parecem parciais demais para serem levadas a serio. mas podemos chamar de O cara porque ele foi uma pessoa que soube ser boa naquilo que fez. simples, nao?
antes de tudo ele foi um puta empreendedor. e aqui nao podemos esquecer a versao crianca-coitadinha, porque eh fato: ele teve uma infancia de quem nao tem onde cair morto, mas soube como, quando, com quem e em que intensidade aproveitar as oportunidades que teve pra construir uma fortuna um tanto quanto improvavel. calculista ou nao, ele botou nao so comida, mas tambem sobremesa, aperitivo e uma bela garrafa de champagne na mesa.
mas mais do empreendendor, e tambem mais do que ator, diretor, produtor, musico, roteirista e compositor, ele foi uma baita dum poeta. acho que nada define melhor a sua obra do que a frase que abre o garoto: "um filme com um sorriso, e talvez uma lagrima". pra mim eh simplesmente magico o jeito com que ele consegue tratar de temas dificilimos, que vao de relacoes interpessoais ao holocausto, com uma graca, com uma leveza, mas ao mesmo tempo com a seriedade que tais questoes merecem.
um filme pouquissimo reconhecido eh Monsieur Verdoux. eh um dos poucos em que ele encarna um personagem diferente do vagabundo de chapeu e bigodinho, ja na ultima fase da sua carreira. na verdade, quando foi lancado o filme foi um fracasso completo, mas hoje ja conquistou um pouco mais de espaco. para mim esta na lista dos melhores. eh a historia de um pai de familia que, ao perder o seu emprego e nao conseguir qualquer outra possibilidade de sustentar mulher e filhos, apela para a unica alternativa que encontra para conseguir dinheiro: comeca a conquistar solteironas ricas, com as quais casa e dias depois as assassina, ficando com a heranca. a esposa verdadeira, logicamente, nao faz a menor ideia da vida dupla do marido. nao, nao vou contar o final, mas digo que eh um verdadeiro tapa na cara.
o que eh lindo, o que eh genial na obra dele eh essa capacidade de comover - e de mover - sem precisar chocar. com excessao dos curtas do comeco da carreira, quando agradar publico e patrao ainda eram prioridade e temas mais futeis eram melhor negocio, a maioria de seus filmes "de peso" pode ser vista com dois olhos bem diferentes: de um lado uma historia engracadinha pra matar dias de ocio, de outro um mar de significados no qual podemos nadar por horas sem chegar ao fim.
mais algumas dicas, a quem quiser gastar algumas idas a locadora para conhecer um pouco mais do trabalho do mocinho:

Luzes da Cidade: tendo se apaixonado por uma florista cega, o vagabundo se decide a ajuda-la a pagar sua cirugia nos olhos, mesmo sem ter um tostao furado no bolso. a historia se completa com um ricaco alcoolatra, salvo de sua tentativa de suicidio pelo vagabundo - como todo bom bebado, o homem eh todo bondade e agradecimentos quando embriagado, mas sempre que o trago passa ele parece nao se lembrar da cara do mendigo que o salvou.

Luzes da Ribalta: outro filme da fase "pos-vagabundo". com um "que" auto-biografico, chaplin interpreta um palhaco que, depois de conhecer o sucesso incondicional, ve sua popularidade decair dia apos dia. o que sobrou de sua carreira soh existe por compaixao dos antigos fas, e suas magoas e medos se perdem nas doses de cachaca. nesse contexto ele acaba por salvar uma jovem bailarina, que acredita ter perdido a capacidade de dancar, de uma tentativa de suicidio. eh ai que comeca um relacionamento belissimo, no qual o palhaco decadente busca forcas onde nao mais tinha para devolver aa ascendente bailarina a vontade de viver. assistir uma vez nao chega pra entender tudo o que o filme tem a dizer.

O Garoto: ja linkado la em cima. um bebe eh abandonado pela mae, sem condicoes de cria-lo. o vagabundo encontra a crianca e, sem conseguir virar as costas, acaba por adota-lo apesar de ser tambem um pe rapado. os dois vivem como pai e filho ate que a "protecao aos menores" aparece, querendo levar o menino para um orfanato. no meio disso, tambem a mae - agora rica, por um golpe de sorte - volta para procurar o filho abandonado que nunca esqueceu. enfim, uma historia bem interessante sobre relacoes humanas, com interpretacoes inesquecieveis. numa escala de 1 a 10, vai uma nota 11 para o entao pequeno Jackie Coogan, que por esse filme virou uma das primeiras criancas-prodigio do cinema.

Tempos Modernos, O Grande Ditador: dispensam apresentacoes.

Um Rei em Nova York: Tambem um fracasso na epoca em que foi lancado e tido por muitos como uma expressao do rancor por ter sido expatriado dos USA, esta eh possivelmente a primeira satira ao "american way of life" da historia, detonando a televisao, musica, publicidade e o proprio cinema com seu mundo de celebridades. nao se preocupem, pra esse nao sao necessarios os lencinhos de papel - a nao ser para aqules que choram de rir.

e pra quem ja conhece e ja gosta mas quer conhecer ainda mais, e esta procurando livros pra encher essas ferias de verao, aconselho a leitura de "Historia da Minha Vida", com traducao de Rachel de Queiroz e editado no Brasil pela Jose Olympio. logicamente eh uma biografia um tanto quanto parcial, por ser auto, mas mesmo assim (e talvez por isso mesmo) muito boa.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

momento citacao da semana

Os sinos dobram
Dobram a esquina radiante
O céu espia mais azul que antes
Os mortos andam como eu nas avenidas
O sangue escorre da mesma ferida
Ergo as mãos pro alto
Nos meus dedos, os anéis
Flores crescem no asfalto debaixo dos meus pés

Tudo silencia
Ouço só meu coração
A rua acaba e meus sonhos vão.
Piso na poça, uma moça estende a mão
Meus olhos brilham, vejo o céu no chão
Ergo as mãos pro alto
Nos meus dedos, os anéis
Flores crescem no asfalto debaixo dos meus pés

(Flores no Asfalto - Zeca Baleiro)

domingo, 16 de dezembro de 2007

e pra terminar o dia

essa pergunta veio com cerca de 3 anos de atraso, mas enfim:
existe dia para todas as profissoes, certo? havera tambem um dia das putas?

eh a vovozinha!

cuspindo no prato em que comeu, meu bem?
que pena!
*tenha uma boa vida*

ah, o natal!

coisa linda por aqui sao os mercados de natal: grandes feiroes que acontecem em dezembro, onde todo mundo pode vender e comprar o que der na telha, na maioria produtos manufaturados vendidos por familias simpaticas em banquinhas na praca da cidade. quase toda a cidade tem um desses, e cada um eh diferente do outro. a unica coisa que permanece igual em todos eh o espirito natalino! criancas tocando musicas da epoca, familias passeando juntas, batedores de carteira.... sim, batedores de carteira!
a senhora escolheu um belo castical de vidro, soprado artesanalmente por um vidreiro italiano, e enquanto ele embrulhava, ela olhou rapidamente na bolsa e disse com toda a naturalidade do mundo: "ah, mas so tem um problema. no momento meu dinheiro se foi." o vidreiro pareceu entender que ela tinha sido descuidada nas contas, e gasto tudo o que tinha em maos, porque respondeu que "eh, isso eh um problema mesmo". mas ao ver que ela continuava a procurar algo na bolsa, ele comecou a entender do que se tratava. "mas como assim, o dinheiro se foi, minha senhora?". "alguem levou". "como assim, levou?". "levou. acontece em mercados de natal. eu comprei alguma coisa perto do carrossel, e la tinha muita gente, alguem deve ter aproveitado." mas os olhos marejados e uma levissima tensao no jeito com que ela acenava a cabeca, contradiziam a tranquilidade da sua voz. pareceu ser mais pra se convencer do que por qualquer outro motivo que ela continuou a repetir "acontece, acontece" enquanto se afastava meio desnorteada.
enquanto buscava minha propria carteira, displicentemente deixada no bolso externo da mochila - porque eh alemanha, eh natal, nao preciso me preocupar por aqui - e guardava ela em lugar mais seguro, nao pude deixar de perceber que o mundo eh o mesmo, na rua da praia ou na praca de um burgo medieval. a epoca natalina aqui eh realmente linda. aconchegante, fofinha, feliz. mas pessoas sao pessoas, no novo mundo ou no velho.

domingo, 9 de dezembro de 2007

troca-troca

e eis que a chefa se compadeceu de mim e criou um amigo-secreto virtual! sim, amigo-secreto virtual! divertido e de graca! detalhes e "inscricoes" no respectivo post da blog da josie! participem =)

pequeno comentario a serio - 3

porque nem tudo sao vampiros e hiphop coreano

numa das primeiras semanas aqui minha hospedeira comentou alguma coisa a respeito de um casal na cidade e usou uma expressao para defini-lo que seria traduzida como "nossos bem-conhecidos". na hora achei que fosse uma palavra inventada para facilitar a vida de alguem com dificuldades na lingua, mas depois de um tempo percebi que esse termo realmente existe e eh usado com uma frequencia incrivel. dai aproveitei uma entrevista que precisava fazer sobre relacoes pessoais para um trabalho de cultura alema e coloquei no meio a pergunta que me enrolava a cabeca: tem alguma diferenca entre amigo e bem-conhecido? porque, pra mim, se tu conheces bem a pessoa e gostas dela ela tua amiga. caso contrario, ela eh apenas conhecida, ueh. mas descobri que aqui tem diferenca, e uma diferenca enorme. a respsta foi unaninme: amigo eh so aquele em quem tu podes confiar, aquele com quem tu ja dividistes muita coisa da tua vida, aquele que nao te usa e que te ajuda sempre que tu precisares. os outros sao bem-conhecidos. achei bonito isso. em portugues falta uma palavra para "bem-conhecidos". a gente coloca tudo no mesmo saco, os amigos com A maiusculo e aquele cara bacaninha que a gente conheceu faz duas semanas. ate falamos que "amigos" sao diferentes de "amigos de verdade". mas a partir do momento que tu usas a mesma palavra para os dois, fica dificil de separar um do outro e fica dificil de saber em quais tu podes, realmente, confiar.
a gente sempre comenta que os europeus sao frios, distantes e etc etc. mas desde que cheguei aqui so tenho recebido ajuda e atencao. para fazer esse mesmo trabalho eu precisa entrevistar uma quantidade consideravel de alemaes. apelei entao para alguns contatos distantes e mandei as perguntas por e-mail para todos os meus conhecidos aqui. nos os amigos, nem os bem-conhecidos: os conhecidos normais mesmo. mandei mais por descargo de consciencia mesmo, porque eu tinha pouquissimo tempo, e achei que ninguem conseguiria (ou quereria) responder. e fiquei chocada quando vi que de todos, apenas 1 nao respondeu. e fiquei mais chocada ainda quando um parente distante, que eu so vi pessoalmente duas vezes na vida, encaminhou minhas perguntas para os seus amigos, e os amigos responderam! gente que nem sabe que eu sou! e mais: uma dessas pessoas desconhecidas eh um professor que resolveu trabalhar as minhas perguntas com seus alunos em sala de aula, e 2 dias depois me mandou uma resposta conjunta de 50 adolescentes. sabe aquela sensacao de descrenca? pois eh.
e dai a gente fala de frieza, que no brasil tem mais calor humano. mas com todo o calor humano brasileiro eu nunca teria visto isso acontecer.
acho que esse distanciamento do povo daqui nao eh questao de frieza. eh mais uma questao de auto-preservacao. se o processo para "fazer amizades" aqui eh muito mais longo, em compensacao ele eh muito mais seguro. aqui quando alguem te chama de amigo tu tens certeza de que essa pessoa esta falando serio e de que, na regra geral, essa afirmacao vai durar pra vida toda.
poooor outro lado - porque SEMPRE existe um outro lado - eh indiscutivel a falta que abracos gratuitos e sorrisos descompromissados fazem na vida de alguem. pelo menos na vida de alguem que esta acostumado. e se o risco de se machucar eh o preco que se paga por beijos de bom dia e cafunes em dias de chuva, eu ainda acho que prefiro pagar a conta.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

de elevador...

nem o frio, nem o semestre pela metade. a maior diferenca do fim de ano aqui eh a ausencia de amigos-secretos.

a melhor ideia mais estupida

esses dias eu parei pra pensar do que, afinal, eu fujo tanto. porque, que esta viagem nasceu de uma fuga, isso eu sempre soube. mas fuga do que?
sempre achei que era das situacoes, das duvidas, talvez de pessoas, da falta de tempo... mas acontece que, quase 3 meses depois, percebi que todas essas coisas vieram junto. e dai foi a constatacao obvia, tao obvia quanto 2+2=5: que nao era das situacoes, duvidas, pessoas ou tempo que eu fugia, mas do jeito como eu reajo a isso tudo. e essa, caros amigos, eh a ideia mais estupida que eu poderia ter. porque eu posso passar a vida inteira fugindo de mim e nunca vou conseguir escapar. e entao nem parte que foge e nem parte que persegue poderao sossegar.
um grande amigo uma vez me disse que se a gente quer ter a parte boa de uma pessoa precisa comprar o pacotinho completo. o contexto era um pouco diferente, mas acho que isso se aplica para esse caso tambem. o pacotinho completo da juliete inclui a inseguranca e o pacotinho completo da brigitte inclui a inconsequencia. e por mais que a brigitte nao suporte a inseguranca da juliete e essa condene a inconsequencia da primeira, eh justamente por isso que uma precisa tanto da outra. e eu amo as duas por igual, por mais que de vez em quando elas me deem dor de cabeca.
entao esta na hora de erguer a bandeira branca. esta declarado o fim da batalha. juliete e brigitte, a partir de hoje, viverao em paz.
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mas se fugir de mim eh a ideia mais estupida que eu poderia ter, essa foi a melhor ideia mais estupida que eu ja tive. enfim, nao fosse por ela, eu nao estaria aqui agora. entao, bendita seja a estupidez humana!

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

a proposito...

...como eh frio o inverno sem um cobertor de orelhas...

momento citacao da semana

(numa traducao amadora. em alemao fica muito mais bonito)

As vezes, no meio da noite, Franzerl acorda. quando isso acontece, ele fica deitado bem quietinho e sem se mexer, porque ele tem medo. Ele bem que gostaria de correr para a cama de sua mae. mas a cama esta longe, e a sua mae diz que esta cansada e gostaria de ter um pouco de paz pelo menos durante a noite. nao existe nenhum dracula, nenhum vampiro e a cabeca do frankenstein eh feita de madeira.
mas as vezes, no meio da noite, quando o Franzerl acorda e fica deitado bem quietinho e sem se mexer, nessas horas ele prefereria que o dracula e o frankenstein e o vampiro estivessem na cama com ele, a estar tao sozinho ali deitado sem coragem nem ao menos de tremer, de medo declarado.